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VAMOS FALAR SOBRE MEDO E ANSIEDADE? -PARTE 1

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Medo é diferente de ansiedade

O medo é uma resposta emocional a uma ameaça real ou percebida enquanto a ansiedade é a antecipação de uma ameaça futura ou incerta (DSM-5).

  • Vamos exemplificar

MEDO: Uma pessoa vê uma cobra em sua frente e sente medo. Nesse exemplo, a cobra é real e está sendo percebida pela pessoa no momento presente.

ANSIEDADE: Uma pessoa vai viajar para um lugar no meio do Pantanal e fica com ansiedade, preocupada com a possibilidade de encontrar cobras. Nesse exemplo, a pessoa nem viajou ainda e muito menos sabe se irá encontrar cobras em sua viagem. A ameaça é incerta (pode não acontecer) e está no futuro.

2) O medo visa garantir nossa sobrevivência

O medo tem um papel protetor de preparar o indivíduo para uma ameaça ou perigo. Portanto, o medo visa garantir a sobrevivência do indivíduo.

Quando sentimos medo, nosso corpo responde com:

  • TAQUICARDIA (“frequência cardíaca acelerada”)
  • TAQUIPNEIA (“respiração acelerada”)
  • DILATAÇÃO DA PUPILA
  • SUDORESE EXCESSIVA
  • PILOEREÇÃO (“pelos arrepiados)
  • PELE FRIA
  • TREMOR (“contração da musculatura”)

Essas reações, dentre outras, ocorrem por causa da ativação do sistema nervoso simpático. Essa ativação gerada pelo medo visa facilitar a resposta de FUGA ou LUTA (Cannon, 1929).

Explicando melhor…

Quando uma pessoa vê uma cobra (fonte de perigo), ela PRECISA se preparar para FUGIR ou LUTAR contra esta ameaça.

Para fugir ou lutar, seus músculos precisam se contrair como nunca, assim vão precisar receber muito sangue com energia (coração acelerado) e receber oxigênio (respiração acelerada). Essa contração importante da musculatura pode ser percebida como tremor. Como seu sangue vai dar preferência para a musculatura envolvida na luta, haverá uma “fuga de sangue” da pele para seus músculos. Assim, sua pele vai ficar fria e pálida por isso, é comum haver suor frio nesses momentos de estresse. Sua pupila precisa estar dilatada para ver melhor e enfrentar o perigo percebido.

3) Com a evolução humana, a fonte da ansiedade e medo mudou.

Na época em que nossos ancestrais viviam como caçadores-coletores, nossas fontes de ameaça tendiam a ser: cobras, onças ou brigas com tribos rivais. O perigo era mais palpável, concreto e realmente, exigia que a resposta de fuga ou luta do medo fosse efetiva. Hoje em dia, nossos estímulos estressores tendem a ser mais nossos pensamentos e preocupações. Para esses estímulos estressores, muitas vezes, não há um risco direto a nossa vida e nem é necessário que seu corpo reaja como se fosse lutar ou fugir.

Vamos exemplificar…

Você pode ficar ansioso para fazer uma apresentação importante no trabalho, porque está com medo de não agradar seu chefe. Nessa situação, você pode sentir seu coração acelerar, sua respiração ficar ofegante e um suor frio cobrir seu rosto. Seu corpo reage como se um leão fosse te devorar e você precisasse correr pela sua vida. Apesar disso, você não corre risco de vida, sua fonte de perigo é seu pensamento, ou seja, aqueles sintomas físicos desagradáveis são só uma resposta do seu corpo às suas preocupações.

 

4) O medo atua como um sistema de vigilância

O medo também pode ser visto como um sistema de vigilância ou um ALARME, como um aviso de que há um perigo no ambiente. Quando esse sistema é ativado, o indivíduo passa a escanear o ambiente procurando ameaças para se preparar para elas.

Pense no alarme de uma casa. Se no meio da noite, o alarme de uma casa toca, o dono procura por ameaças, porque pode ser um ladrão. Se ao verificar a casa, o dono percebe que se tratava somente de um gato que bateu no sistema de alarme, ele pode desligar o aviso e voltar a descansar tranquilamente, porque “não era nada”. Nesse caso, foi um alarme falso.

5) Às vezes o medo vira um problema

De forma semelhante ao que ocorre no alarme de uma casa, o nosso sistema de alarme MEDO também pode ser vítima de “ALARME FALSO” (Barlow, 2002). Isso acontece quando esse sistema dispara sem haver uma AMEAÇA REAL no ambiente. Nessa situação, a pessoa pode sentir medo intenso associado a sintomas físicos desagradáveis mesmo sem haver um perigo no ambiente que justifique ou que seja proporcional a sua reação.

Vamos exemplificar com um personagem fictício …

Ana está passando por um momento de estresse e começa a ter episódios de taquicardia (coração acelerado). Sempre quando apresenta estes episódios, sente suor frio, sensação de sufocamento e tontura e fica com medo de morrer. A preocupação de Ana, neste caso, é importante para que ela procure atendimento médico.

Faz sentido pensarmos que isto pode ser um perigo real, porque poderia ser uma doença cardiológica.

Entretanto, após procurar atendimento médico, Ana faz diversos exames passados pelo cardiologista e este, após cuidadosa avaliação, diz que aqueles episódios são crises de ansiedade. Apesar do medo e preocupação de Ana, não há nada de errado com seu coração. Foi um alarme falso.

Depois de voltar para casa, Ana continua com as crises.

O coração de Ana acelera -> o sistema de alarme de medo de Ana é ativado-> ela continua achando que tem alguma coisa errada com seu coração e fica com medo de morrer.

Por causa da avaliação médica, nesse caso, sabemos que se trata de um alarme falso.

Assim, mesmo sabendo que não há um perigo real, o “sistema de alarme – MEDO” de Ana está sendo disparado na crise de ansiedade, ainda que seu médico tenha explicado que ela não possui uma doença cardiológica.

Esta pequena história, serve para exemplificar que, em algumas situações, o “nosso alarme – medo” pode ficar “desajustado”, ou seja, estar tocando sem haver uma ameaça real.

6) Ansiedade é diferente de transtorno de ansiedade.

O medo e a ansiedade adaptativos (“normais”) ocorrem em resposta a um estressor breve e são transitórios, enquanto os transtornos de ansiedade tendem a ser persistentes, desproporcionais ao estímulo estressor ou estarem ocorrendo além do nível apropriado do desenvolvimento da pessoa (“além da idade esperada”) (DSM-5). Um exemplo da última característica citada ocorre no transtorno de ansiedade de separação, no qual a criança é apreensiva ou ansiosa quanto à separação das figuras de apego até uma idade em que se esperaria que este comportamento não estivesse mais ocorrendo (DSM-5).

No próximo post, vou explicar quais são os principais transtornos de ansiedade e os tipos de tratamento disponíveis.

 

  • Caso você apresente os sintomas citados acima, procure auxílio de um profissional qualificado, um psiquiatra ou psicólogo. No caso de queixas como dor no peito, procure avaliação médica. Esse texto não substitui uma consulta médica.

 

 

Referências

Barlow, D. H. (2002). Anxiety and its disorders: The nature and treatment of anxiety and panic (2nd ed.). Guilford Press.

Cannon, W. B. (1929). Bodily changes in pain, hunger, fear and rage (2nd ed.). New York: Appleton- Century-Crofts.

DSM-5 American Psychiatric Association. (2013). Diagnostic and statistical manual of mental disorders (5th ed.). Washington, DC: Author.

 

 

Escrito por Dra. Lorenna Sena, que atua como médica psiquiatra na Clínica Avicena e no Corpo de Bombeiros do DF. Doutora em Psiquiatria pela UFRGS. CRM-DF: 25294 RQE: 16411

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